terça-feira, 28 de outubro de 2014

O Homem Medíocre




“O homem medíocre sente um pouco de admiração por todas as coisas; porém, nenhuma admira com entusiasmo... Acha insolente toda afirmação porque está exclui a proposição contrária. E se fores um pouco amigo e um pouco inimigo de todas as coisas, te admirará por serdes sábio e reservado. O homem medíocre proclama que todas as coisas têm seu lado bom e seu lado mal e que não se deve ser absoluto em seus juízos. Se resolutamente afirmas a verdade, o medíocre dirá que tens demasiada confiança em ti mesmo. O homem medíocre lamenta que existam dogmas na religião cristã; seu desejo seria que se ensinasse somente a moral; e se dizes que a moral se origina no dogma, te respondera que exageras... Se a palavra “exagero” não existisse, ele a inventaria.

O medíocre parece habitualmente modesto; não pode ser humilde, a não ser que deixe de ser medíocre. O homem humilde despreza todas as mentiras, mesmo que todo o mundo a exalte, e cai de joelhos diante da verdade... Se um homem naturalmente medíocre se faz cristão de verdade, deixa em absoluto de ser medíocre... O que ama jamais será medíocre.”

Ernesto Hello, L’Homme, II, c. VIII.

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

São Gregório Magno, Papa, sobre os Dons e Carísmas do Espírito Santo

Para os que pensam ter o dom das línguas, mas  que perderam o dom de ouvir
São Gregório Magno, foi Papa no final do século VI. Foi um dos maiores Papas da Igreja. Em um de seus sermões, ele tratou dos pretensos carismas, e o que ele disse então responde perfeitamente às pretensões do falso misticismo da RCC de hoje em dia.
Este sermão, foi feito por esse santo Papa, no dia da Ascenção de Nosso Senhor Jesus Cristo, em 24 de Maio de 591, na basílica de São Pedro, comentando o texto do Evangelho de São Marcos (XVI, 15-20).

Ele será bem útil àqueles que, sendo humildes,  amarem mais terem ouvidos para ouvir do que pretenderem ter línguas estranhas para falar.  
Ouçamos, pois, São Gregório:
***
Eis os sinais que acompanharão aqueles que terão acreditado: em meu nome, eles expulsarão os demônios, eles falarão em línguas novas, eles pegarão em serpentes, e se tiverem bebido algum veneno mortal, ele não lhes fará nenhum mal. Eles imporão suas mãos aos doentes e estes serão curados” (São Marcos, XVI,16).
Será que, meus caros irmãos, pelo fato de que vós não fazeis nenhum destes milagres, é sinal de que vós não tendes nenhuma fé?

Estes sinais foram necessários no começo da Igreja. Para que a Fé crescesse, era preciso nutri-la com milagres. Também nós, quando nós plantamos árvores, nós as regamos até que as vemos bem implantadas na terra. Uma vez que elas se enraizaram, cessamos de regá-las.

Eis porque São Paulo dizia:”O dom das línguas é um milagre não para os fiéis, mas para os infiéis” (I Cor, XIV,22).
Sobre esses sinais e esses poderes, temos nós que fazer observações mais precisas?

A Santa Igreja, faz todo dia, espiritualmente, o que ela realizava então nos corpos, por meio dos Apóstolos. Porque, quando os seus padres, pela graça do exorcismo, impõem as mãos sobre os que crêem, e proibem aos espíritos malignos de habitar sua alma, faz outra coisa que expulsar os demônios?

Todos esses fiéis que abandonam o linguajar mundano de sua vida passada, cantam os santos mistérios, proclamam com todas as suas forças os louvores e o poder de seu Criador, fazem eles outra coisa  que falar em línguas novas?

Aqueles que, por sua exortação ao bem, extraem do coração dos outros a maldade, agarram serpentes.

Os que ouvem maus conselhos sem, de modo algum, se deixar arrastar por eles a agir mal, bebem  uma bebida mortal, sem que ela lhes faça mal algum.

Aqueles que todas a vezes que vêem seu próximo enfraquecer, para fazer o bem, e o ajudam com tudo o que podem, fortificam, pelo exemplo de suas ações, aqueles cuja vida vacila, que fazem eles senão impor suas mãos aos doentes, a fim de que recobrem a saúde?
Estes milagres são tanto maiores pelo fato de serem espirituais, são tanto maiores porque repõem de pé, não os corpos, mas as almas.

Também vós, irmãos caríssimos, realizais, com a ajuda de Deus, tais milagres, vós os realizais, se quiserdes.

Pelos milagres exteriores não se pode obter a vida. Esses milagres corporais, por vezes, manifestam a santidade. Eles não criam a santidade.

Os milagres espirituais agem na alma .Eles não manifestam uma vida virtuosa. Eles fazem vida virtuosa.

Também os maus podem realizar aqueles milagres materiais. Mas os milagres espirituais só os bons podem fazê-los.

É por isso que a Verdade diz, de certas pessoas: “Muitos me dirão, naquele dia: “Senhor, Senhor, não foi em teu nome que nós profetizamos, que nós expulsamos os demônios e que realizamos muitos prodígios? E Eu lhes direi: "Eu não vos conheço. Afastai-vos de Mim, vós que fazeis o mal” (São mateus VII, 22-23).
Não desejeis, ó irmãos caríssimos, fazer os milagres que podem ser comuns também aos réprobos, mas desejai esses milagres da caridade e do amor fraterno dos quais acabamos de falar: eles são tanto mais seguros pelo fato de que são escondidos, e porque acharão, junto a Deus, uma recompensa tanto mais bela quanto eles dão menor glória diante dos homens”

(São Gregório Magno, Papa, Sermões sobre o Evangelho, Livro II, Les éditions du Cerf, Paris, 2008, volume II, pp. 205 a 209).

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Os Mártires da Revolução Francesa



"...É um elenco tão vasto e tão admirável que hesitamos em destacar alguns dos episódios mais comoventes. não será injusto dar sequer a impressão de que queremos fixar um palmarès, um elenco de vencedores, quando em todas as páginas desse livro escrito com sangue brilham o heroísmo e a santidade? Padres, religiosos, religiosas, simples leigos, homens e mulheres, todas as condições sociais à mistura - mas certamente a maioria gente humilde, dente do povo -, foram às dezenas, às centenas, os que preferiam morrer a abjurar. Como escolher entre eles?

Vemos surgir, mais tarde tornadas ilustres pelo teatro e pelo cinema, as dezesseis Carmelitas de Compiègne, que morreram a 17 de julho de 1794, dez dias antes da queda de Robespierre. Presas por terem continuado a viver juntas após a supressão do seu convento, levadas perante o tribunal revolucionário, uma delas teve a presença de espírito bastante para perguntar a Fourquier-Tinville o que é que ele entendia pelo termo "fanatismo" com que as brindava. E que, tendo ele respondido: "O vosso fanatismo é a vossa tola paixão pelas estúpidas práticas religiosas", replicou: "Ó irmãs, ouviste bem? Somos condenadas pela nossa religião...Que felicidade morrer por nosso Deus!" Exatamente: com essas palavras, o acusador acabava de fazer mártires. Ao pé do cadafalso, elas renovaram os votos e entoaram o Veni Cretor, que só deixou de se ouvir quando a última foi morta...Página grandiosa, digna de ser exaltada, como foi, por Gertrud von le Fort e por Geoge Bernanos.

Mas terão sido menos sublimes essas sacramentinas de Bollène que, antes de morrer, agradeceram aos juízes e aos algozes, e uma das quais beijou o cadafalso antes de lá subir? Ou as ursulinas de Valenciennes, que cataram o Te Deum e rezaram pelos carrascos? Ou as Irmãs da Caridade de Arras, que chegaram à guilhotina cingidas nos Terços? E outras tantas que é impossível evocar sem emoção...

Entre os homens, quantos foram igualmente heroicos! Os beneditinos da Secção dos Gravilliers, que declararam com firmeza nunca terem deixado de celebrar a Missa clandestinamente... O padre Imbert, dominicano de Castres, que, condenado a morte, se recusou a subir à carroça, dizendo: "O meu Senhor Jesus ia a pé ao Calvário; reclamo para mim ir a pé"...Os recoletos e os carmelitas de Arras, que marcharam para o suplício cantando as Vésperas dos Defuntos...

No clero secular, as figuras exemplares são inúmeras. Aqui vemos o Cormaux, "o santo da Bretanha", que, no decurso do interrogatório, se recusa a dissimular a mínima parcela da verdade, fornecendo ele próprio argumentos aos acusadores... E van Cleemputte, que, se adianta a declarar que nunca deixou de fazer um apostolado clandestino... E Noel Pinot, que, conduzido para a morte, vestido de alva e casula por derrisão, recita ao pé do cadafalso o Introibo ad altare Dei da sua última Missa... E o encantador padre Salignac-Fénelon, fundador e diretor da Obra dos Padres Savonianos: condenado, ainda prega do alto da carroça que o leva ao suplício...

A lista seria interminável! E ainda teríamos de acrescentar dezenas de leigos que, com toda a evidência, morreram como testemunhas da Fé. Em Lyon, é o comerciante Auroze, que à pergunta "Es fanático?", responde: "Serei o que quiseres, mas o que sou é católico", e por isso foi condenado. Em Anjou, é um senhor chamado De Valfons, que, no início do interrogatório para identificação, acrescenta ao sobrenome os adjetivos "Católico, Apostólico, Romano"... Em Seine-et-Oise, é Marie Langlois, mocinha de vinte e dois anos, criada de lavoura, que, denunciada pelo pároco constitucional, troça visivelmente dos juízes e de suas perguntas ocas... Noutro lugar, é Elisabeth Minet, que reivindica altivamente a responsabilidade de uma enorme falta: durante todo o Terror, nunca deixou de distribuir estampas de Nossa Senhora...Alhures, é Geneviève Goyon, costureira de setenta e seis anos, que se recusa a entregar dois dominicanos que tem escondidos em sua casa, e morre com eles...

Já de há muito a História registrou a eficácia sobrenatural do martírio, o seu misterioso poder de resgate."

Daniel Rops, A Igreja das Revoluções (I). Quadrante, São Paulo, 2003, Pag. 70, 71.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Mulheres na Universidade



Por Bispo Richard Wiiliamson
Winona, 1 de setembro de 2001

Caros Amigos e Benfeitores,

Os canadenses me parecem um povo gentil, mas “atingir” é a palavra! Dez anos atrás me perguntaram inocentemente no Canadá se as mulheres devem usar calças. Cerca de dez semanas atrás, também no Canadá, me perguntaram se uma menina deve ir a uma universidade conservadora Novus Ordo. A resposta agora à segunda questão pode ser tão tempestuosa como a resposta à primeira: por causa de todos os tipos de razões naturais, quase nenhuma garota deve ir para qualquer universidade!

A razão profunda é a mesma que a do erro do uso de calças por mulheres: a desfeminização da mulher. A causa profunda em ambos os casos é que o homem revolucionário traiu a  mulher moderna; já que ela não é respeitada e amada por ser mulher, ela tenta tornar-se um homem. Como o homem moderno não quer que ela faça o que Deus quer que ela faça, ou seja, ter filhos, ela se vinga, invadindo todos os tipos de coisas que o homem está destinado a fazer. O que mais era de se esperar? O homem moderno só tem a si mesmo para culpar.

De fato, somente em tempos modernos as mulheres sonharam em ir para a universidade, mas a ideia já se tornou tão normal que até mesmo os católicos, cuja Fé guarda a Natureza, podem ter dificuldade em ver o problema. No entanto, aqui está um ponteiro na direção da normalidade: qualquer católico com o mínimo de respeito pela Tradição reconhece que as mulheres não devem ser sacerdotes – ele pode negar que, se algumas mulheres foram para a universidade, quase nenhuma gostaria de ser sacerdote? Infelizmente, as mulheres indo para a universidade é parte de todo o ataque maciço sobre a Natureza de Deus que caracteriza os nossos tempos. Que as garotas não devem estar nas universidades flui a partir da natureza das universidades e da natureza das garotas: as universidades verdadeiras são para as ideias, as ideias não são para as verdadeiras garotas, então universidades verdadeiras não são para as garotas verdadeiras.

A NATUREZA DAS UNIVERSIDADES

Vamos começar com a verdadeira universidade. Conforme definido pelo Cardeal Newman, em sua famosa “Ideia de uma Universidade”, é “um lugar para ensinar o conhecimento universal”. Universidades neste sentido foram uma criação da Igreja Católica na Idade Média, e, como o Cardeal recorda esplendidamente, a teologia tem um lugar de honra lá porque, como a ciência do Ser Supremo, é a ciência suprema somente que pode apontar a todas as outras ciências seu lugar adequado. Assim, uma verdadeira universidade é um lugar de aprendizagem da realidade sob a realeza da teologia católica. O valor das ciências e essa necessidade delas por teologia são as causas pelas quais a Igreja Católica está sempre tendendo a criar universidades, e por que só ela pode criar verdadeiras universidades, direcionando todo o estudo, finalmente, para a glória de Deus e a salvação das almas.

A partir disso, deve-se questionar que tipo de realeza pode ser exercida por teólogos Novus Ordo, mesmo que sejam conservadores. Normalmente “conservadores” católicos que deixaram a Tradição são de má-fé, assim serão maus professores, enquanto que aqueles que nunca conheceram a Tradição serão ignorantes, e então serão maus professores. Ambos tentarão “resgatar” uma donzela em dificuldade “cismática” ou “excomungada”. Portanto, uma menina tradicional colocando-se sob professores “conservadores”, para manter sua fé, terá que fazer um esforço especial para resistir aos homens que Deus planejou (e seus pais pagaram) para ela seguir. Ela, então, estará voluntariamente assim colocando sua verdadeira Fé Católica contra sua verdadeira natureza feminina, que uma ou outra é quase obrigada a sofrer.

Decorre também da realeza da Teologia que numa era democrática como a nossa, em que se rejeita Deus e se destrona a Teologia, as universidades serão um non-sense. Com certeza. Ao nosso redor vemos “universidades” que são muito piores do que bordéis, não só por causa da “igualdade” democrática indiscriminada que arrebanha lá todos os tipos de garotos e garotas com pouco ou nenhum interesse em ideias, e por isso eles não deveriam estar estudando em primeiro lugar, mas também, ao silenciar a Teologia e tornar a Filosofia ridícula, essas “universidades” corrompem a parte superior da natureza dos jovens, suas mentes, deixando sua natureza inferior com pouco ou nenhum meio de resistir à promiscuidade apoiada e instigada dos jovens de ambos os sexos. Observe o desperdício em qualquer campus de “universidade” atual: desmasculinizados irresponsáveis e desfeminilizadas vulgares cuja nobre atividade é jogar frisbees uns nos outros!

Tais “universidades” dedicadas a desafiar Deus e a Natureza, fazem picadinho da Fé dos jovens (se é que eles tinham alguma), da sua moral e de seu bom senso. Pobres pais. Mas eles zombaram de Deus, e de Deus não se zomba. Obviamente nenhum menino, e muito menos qualquer menina, deve ser enviado para tal “universidade”. O que precisa ser provado é que, mesmo em uma universidade decente, se tal pudesse ser encontrada, poucas garotas deveriam ser enviadas ou nenhuma. Isso é por causa da natureza das garotas dada por Deus. Que, apesar da propaganda massiva de hoje em oposição a isso, é bastante diferente da natureza dada por Deus aos meninos!

A NATUREZA DAS GAROTAS

Para uma compreensão sadia da natureza da mulher, deixe-me apelar para Doutor comum da Igreja, Santo Tomás de Aquino, distante agora, por três quartos de milênio de nossos próprios tempos perturbados. As três razões que ele dá em sua Summa Theologiae (2a, 2ae, 177,2) pelas quais a mulher não deve ensinar na Igreja em público podem todas ser aplicadas a por que ela não deve ensinar ou aprender em uma universidade pública. Em primeiro lugar, diz ele, o ensino é para os superiores, e a mulher não deve ser superior, mas sujeita ao seu homem (Gen III, 16). Em segundo lugar, as mulheres saindo para ensinar em público podem facilmente inflamar a luxúria dos homens (Ecclus IX, 11). Em terceiro lugar, “As mulheres não são geralmente (“communiter”) perfeitas em sabedoria”.

Para compreender estas três razões, vamos voltar mais cinco milênios, a Adão e Eva. Como a palavra “natureza” vem da palavra latina para “nascer”, então para estudar a natureza de algo temos que remontar ao seu nascimento. Eva foi criada por Deus para ser uma “ajuda” para Adão (Gn 11,18). Ela existia para ajudar, diz Santo Tomás de Aquino em outro lugar (1a, 92,1), e não para qualquer outro trabalho que o de geração (ou de reprodução), porque para qualquer outro trabalho o homem poderia ser mais adequadamente ajudado por outro homem. Segue-se que a natureza da mulher é intrinsecamente orientada para a maternidade, então para todas as coisas relativas à maternidade ela é superior do homem, em tudo o mais ela é seu inferior, e em nenhuma de todas as coisas em que os dois sexos são complementares eles são iguais.

Agora, para atrair um homem, de modo a se casar e se tornar mãe, a criar e educar os filhos e reter seu pai, ela precisa de dons superiores de sentimento e instinto, por exemplo, delicadeza, sensibilidade, tato, perspicácia, ternura, etc., pelos quais sua mente vai correspondentemente ser seduzida, razão pela qual nenhum marido pode entender como a mente de sua esposa funciona! Para fazer o trabalho da geração, ou seja, para assegurar nada menos do que a sobrevivência e a continuidade da humanidade, Deus projetou sua mente para executar, de forma complementar e diferente de seu homem. A mente dele é projetada para não ser influenciada por sentimentos, mas, pelo contrário, para controlá-los, de modo que, enquanto seus sentimentos podem ser inferiores aos dela, a sua razão é superior. E a razão é feita para governar em seres racionais, então ele é feito para governar sobre ela (Gênesis III, 16), como pode ser visto, por exemplo, sempre que ela precisa recorrer a ele para que seus sentimentos não fiquem fora de controle.

Correspondentemente, enquanto ela sente a família (e adora falar sobre isso), ele responde ao mundo em volta e quer dominá-lo (Gen II, 15,19,20). Enquanto ela é orientada para as pessoas, ele é orientado para a realidade (quantas vezes uma mulher puxa uma idéia ou uma questão de realidade de volta para família! “Você é contra a bebida? Você está atacando meu marido!”. Isso está na natureza da mulher. Não se deve zombar dela por causa disso). Então enquanto ela é rainha do sentir dentro de casa, ele deve ser o rei da razão na casa. Assim, enquanto ele deve amá-la e ouvi-la, no fim das contas, ela deve obedecer-lhe, porque ele é feito para ter a visão mais ampla e ser o mais razoável (Ef V 22,25; Col III, 18,19).

Primeira razão

Agora, o que uma universidade pede? Considerando que, nas “universidades” modernas todos os machos acreditam no “se você se sente bem, faça”, é por isso que eles são, como eles desejam, invadidos por mulheres que sentem, ao contrário de uma verdadeira universidade onde se pensa sobre a realidade universal, que é prerrogativa dos homens. Uma mulher pode pensar desta maneira, ou fazer uma boa imitação de lidar com ideias, mas então ela não estará propriamente pensando como mulher. O dilema é inevitável: ela não pode fazer o que é propriamente o pensamento ou o trabalho dos homens sem cortar toda a sua natureza mais profunda. Essa advogada checou seu penteado pouco antes de entrar na corte? Se ela fez isso, ela é um advogada distraída. Se ela não fez, ela é uma mulher distorcida.

Além disso, o pensamento de uma verdadeira universidade tende a produzir líderes porque verdadeiros estudantes têm ponderado em mais ou menos realidade universal. O Cardeal Newman pode argumentar que a mente cultivada é um fim em si, mas se a Mãe Igreja sempre criou universidades, não é porque uma elite de mentes pensantes irá em qualquer sociedade ajudar poderosamente muitas almas a chegarem ao Céu, se essas mentes estudando tem sido governadas acima de tudo pela verdadeira Fé? Mas as mulheres não são nem feitas, nem normalmente dotadas, para ser líderes! Por isso as garotas não devem estar na universidade. Quanto a uma rainha Isabel a Católica, a Espanha foi a família dela e ela nunca foi para a universidade! Nem Teresa de Ávila, Catarina de Sena ou Joana d’Arc.

Concretamente, se uma garota dedica vários anos da sua juventude e muito dinheiro de seus pais para a aquisição de uma formação universitária, especialmente uma decente, o quão facilmente ela vai se submeter a seu marido, especialmente se ele não teve tal educação? E como ela pode não discutir com ele se ele teve? E se ela tem uma “graduação”, como é que ela vai pensar em si sobre as humilhações múltiplas de estar “descalça e grávida”? E se ela é uma “pós-graduada”, como é que ela não vai manter-se superior a ser um “vegetal na pia da cozinha”? E se ter uma família faz com que ela se esqueça do jeito certo de tudo sobre “graduação”, “diplomas” e “Universidade”, por que ir para lá em primeiro lugar? O dilema é inescapável: ao fazer coisas masculinas como ir para a universidade, ou ela está apenas vivendo um faz-de-conta ou ela está prejudicando o seu potencial para a maternidade – conclusão: ela não deve ir para lá.

Segunda razão

Chegamos a segunda razão de Santo Tomás: o inflamar da luxúria. Disse o suficiente sobre os unibrothels [casas universitárias para ambos os sexos] de hoje. O que vai acontecer se montes de garotos e garotas forem jogados juntos com menção ao que Deus sempre proibiu é totalmente sabido pelo bom senso, mas essa não é a história toda!

Vamos supor que uma menina decente pode encontrar uma universidade decente que está cultivando uma extensa frente de mentes pensantes de uma elite de meninos que irão prover o mundo de amanhã com seus líderes. Se ela é inteligente o suficiente para estudar, ela não será inteligente o suficiente para saber que mesmo que ela não queira distrair os meninos, ela ainda vai ser uma distração? Por esta razão não há exceção. Então, se ela é assim decente, ela não prefere deixar de distrair os futuros líderes que ela e toda a sociedade de amanhã vão precisar? Então, quanto mais decente a universidade, mais longe ela não vai ficar? Que mulher pode se imaginar participando dos Diálogos de Platão? Nem mesmo a Virgem Maria participou da Última Ceia. Garotas na universidade são uma dupla fonte de confusão, tanto fazendo o que as garotas não foram feitas para fazer, quanto distraindo os meninos de fazer o que os meninos foram feitos para fazer.

Em qualquer verdadeira universidade, os estudantes que valem a pena não querem se distrair com as garotas. Esses são exatamente os potenciais maridos que as garotas realmente inteligentes vão buscar depois. É por isso que até mesmo as garotas realmente inteligentes não devem estar na universidade.

Terceira razão

Deveras – a terceira razão de Santo Tomás – “as mulheres não são geralmente perfeitas em sabedoria”. Isto porque a sabedoria sobre a família que a mulher tem é impagável, ela vem diretamente de Deus, mas é como sabedoria, porque ordena apenas uma parte da realidade.

O pensamento da mulher é subjetivo, interior, intuitivo, concreto, de pequena escala, com um dom para detalhes amáveis. O pensamento de uma universidade precisa ser objetivo, para fora, racional, abstrato, em grande escala, direcionado para os grandes princípios. O pensamento dela segue seu coração. O pensamento da universidade só pode seguir a cabeça. Enquanto um professor universitário está ensinando, o menino está ouvindo e aprendendo com as palavras, mas a menina estará, naturalmente, ouvindo o homem e aprendendo por osmose. Apenas por um esforço ela vai conseguir ouvir as palavras, porque seu coração está em outro lugar – geralmente nos meninos. Naturalmente dóceis e, possivelmente, possuidoras de cérebros mais do que suficientes, elas podem sempre fazer uma boa imitação de um bom aluno, especialmente se elas desejam agradar a um professor do sexo masculino em particular. Novamente, elas não devem ser ridicularizadas por isso, na medida em que Deus as projetou para agradar e atrair – um marido. Raramente, porém, a estudante impressionante pode ser uma aluna muita boa, porque o Senhor Deus simplesmente projetou seu coração e mente para uma tarefa completamente diferente. Garotas, vocês realmente querem gastar muito de seu tempo e do dinheiro dos seus pais fazendo algo que Deus quase com certeza não quis que vocês estivessem fazendo?

OBJEÇÕES

Mas Pio XII encorajou a fazer o melhor ao ser forçada a sair para o mundo? – Talvez ele estivesse fazendo o melhor de uma situação já ruim em 1940 e 1950, quando ele esperava que as mulheres levassem a sua feminilidade para o domínio público. No entanto, pelas definições de “feminino” e “público”, isso é uma contradição em termos. Cinquenta anos depois, quem pode negar que o domínio público tem desfeminizado a mulher? Como um amigo disse: “As mulheres costumavam ter carreiras abertas para elas só em enfermagem e ensino, o que elas faziam bem. Agora elas já não sabem como fazer nem isso também!”
É tempo para os católicos de opor-se ao atual e de opor-se ao mundo! A Europa, centro da Cristandade, está entrando em colapso, porque as garotas europeias estão todas sendo ensinadas a ir para a “universidade” e “adiar” a hora de ter filhos! A mulher e a família estão em crise desesperada! Queremos seguir os suínos para o precipício?

Mas os homens de hoje são incapazes de liderar, então você tem que ir para a universidade para tomar seu lugar? Você não pode tomar o seu lugar!!! (A exceção confirma a regra). Hoje você está apenas seguindo-os para as “universidades”, amanhã você estará seguindo-los. De um jeito ou de outro, faça algo maternal, desempenhe o seu papel como Deus quer que você faça, e Deus pode lhe enviar do alto os líderes viris e o marido pelo qual você ora e do qual precisa, mas você não pode pela natureza das coisas torcer a si mesma de baixo. Você não pode restaurar a ordem de Deus, quebrando-a. Para trás de seus homens! Atrás você tem um enorme poder para inspirar e orientar. Na frente, você vai simplesmente torná-los mais irresponsáveis do que nunca…

Mas o que dizer da escola dos dominicanos para garotas em Idaho? – Por mais que Santo Tomás de Aquino desaprove as mulheres ensinando em público, ele aprova seu ensino em privado, em outras palavras, em casa “ou em um ambiente caseiro”. Uma universidade não pode se assemelhar a uma casa, mas sábias mães podem manter uma escola secundária para garotas como uma casa.

Mas onde as escolas secundárias para garotas irão encontrar professoras, se as garotas não forem para a universidade? –Não há necessidade de universidade para aprender sobre a maior parte do que estudantes secundárias precisam ser ensinadas, por exemplo “economia doméstica, cuidados com a casa, administração de uma casa, o cuidado e a educação das crianças, a preparação espiritual e social para o casamento” – é a lista atemporal de Pio XII para a União de Mulheres Católicas, em 24 de junho de 1949. É claro que se a lei da terra, como agora na França, exige “diplomas” da “universidade” para que as mulheres possam ensinar ou para abrir escolas para garotas, então a presença de algumas mulheres na “universidade” torna-se, durante a vigência da referida lei, uma excepcional necessidade. No entanto, as exceções fazem regras ruins!

Mas o que dizer sobre a faculdade mista da Fraternidade São Pio X, em Santa Maria, no Kansas? – Ainda é uma operação de escala familiar, típica da unidade da Igreja verdadeira de ensinar a verdadeira fé com tanta profundidade quanto possível em meio a circunstâncias difíceis, mas conforme se expandir e aumentar no futuro a verdadeiro nível de ensino universitário, eu, pelo menos piamente espero que os meninos vão até lá estar liderando tanto e dando tanto exemplo, criando esse mundo novo, que as garotas já não sentirão qualquer necessidade de estarem presentes.

Mas o que, entretanto, as garotas que têm um cérebro, e não estão prontas para casar podem fazer? – Deixe-as usar seu cérebro: em primeiro lugar, para compreender como Deus as projetou, e para qual papel; em segundo lugar, para rezar a Deus para que Ele conceda a nós todos alguns homens; em terceiro lugar, ler em casa por conta própria (por exemplo, Jane Austen, um clássico exemplo do quanto a mulher doméstica pode fazer); em quarto lugar, para elaborar com seus pais um lugar feminino e uma função onde podem amadurecer para o casamento. Ou – pelos Céus! – deixe que elas pensem numa vocação! Velho ditado: “Uma mulher é uma vez uma mulher, uma freira é duas vezes uma mulher”!

CONCLUSÃO

Por todas estas razões, as garotas domésticas não são, por natureza feitas para as universidades públicas. Onde é que o homem moderno erra?

Como o homem se coloca no lugar de Deus, então esta vida na terra bloqueia a visão de qualquer pós-vida no Céu de Deus ou no Inferno. O orgulho do homem desencadeia a sua inclinação para o prazer aqui embaixo. O ego vem em primeiro lugar, mas as crianças – ainda que inconscientemente – demandam e recompensam o altruísmo em seus pais. Portanto, as crianças, e a demanda, e a recompensa, são deixadas de lado. Mas a natureza da vida da mulher é centrar-se em torno das crianças. Portanto, a vida da mulher em particular, torna-se vazia, assim como a sua casa, especialmente se as condições de trabalho levam seu marido também para fora. Ela vai, inevitavelmente, segui-lo em seus domínios, por exemplo, para a universidade, onde ela é susceptível de impor padrões femininos que não pertencem [a este lugar], mas que estão frustrados em casa. Ela não vai deixar o seu ser permanecer sem sentido!

Como esta carta tem dito frequentemente, tal quebra na família, no lar e na mulher é uma violação muito profunda da Natureza para que o modo moderno de vida possa sobreviver. Com os homens na liderança, os católicos, cuja Fé deve dar-lhes uma ajuda com relação a Natureza, serão sábios, de acordo com as circunstâncias, para tomar medidas correctivas agora. A jornada de mil milhas começa com o primeiro passo.

Homens, pensem! Deem substância à casa! Garotas, eu abençoo vocês, seus pais e todos os queridos leitores.

Atenciosamente em Cristo.

Fonte: http://rosamulher.wordpress.com/2012/11/26/garotas-na-universidade/#comments

                                                                                                     
Traduzido por Andrea Patricia


segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Vida Oculta em Nazaré

Père Garrigou-Lagrange
La Mère du Sauveur et notre vie intérieur

Maria recebe incessantemente de graça e de caridade, quando leva o Menino nos braços, O alimenta, quando recebe Suas carícias, escuta Suas primeiras palavras, o sustenta em Seus primeiros passos. O Menino, entretanto – diz São Lucas (II, 40) – crescia e se fortificava, estando cheio de sabedoria e a graça de Deus estava nele.” Quando tinha doze anos, acompanhou a Virgem Maria e São José a Jerusalém para celebrar a Páscoa, e no momento do regresso, ficou na cidade sem que seus pais percebessem. Somente no final de três dias o encontraram no Templo entre os doutores da Lei. E Ele os disse: “Porque me buscavam? Não sabiam que devo me ocupar das coisas de meu Pai? Mas eles – faz notar São Lucas, II, 50 – não entenderam o que os dizia.”

Maria Santíssima aceita na obscuridade da fé o que não podia compreender; o mistério da Redenção se irá revelando progressivamente em toda sua profundidade e extensão. Constituiu uma grande alegria o encontrar Jesus, porém esta alegria deixava pressentir muitíssimos sofrimentos.

Bossuet (1) faz estas observações, a propósito da vida oculta de Nazaré, que se prolongou até o ministério público de Jesus: “Os que se chateiam por Jesus Cristo e se envergonham por vê-lo passar a vida em tão estranha obscuridade, se chateiam também com respeito à Maria Santíssima e querem lhe atribuir inúmeros milagres. Mas escutemos o Santo Evangelho: ‘Maria guardava todas essas coisas em seu coração’ (Luc., II, 51)... Não é um emprego bastante digno este de conservar em seu coração tudo o que havia notado e visto de seu caro Filho? Se os mistérios de sua infância foram tão grato passatempo, quanto não se alegraria em ocupar se e meditar em todo o resto da vida de seu Filho? Maria Santíssima meditava em Jesus... permanecia em continua contemplação, fundindo se e derretendo se, por assim dizê-lo, em amor e desejos... Que diremos, pois, de todos esses que inventam belas lendas referentes à Santíssima Virgem? O que vamos dizê-los se a humilde e perfeita contemplação não os basta e satisfaz? Porém, se bastou a Maria e a Jesus, durante trinta anos, não foi mais que o suficiente para a Virgem continuar neste santo exercício? O silêncio da Escritura, com respeito a essa divina Mãe, é mais sublime e eloquente que todos os discursos. Ó homem, demasiado ativo e inquieto por tua própria atividade! Aprende a contentar se com escutar a Jesus em teu interior, lembrando-te Dele e meditando em suas palavras... Orgulho humano! Porque queixais tu com teu desassossego, por não ser nada no mundo? Que personagem foi Jesus nele? E entretanto, que celebridade a de Maria! Eram a admiração do mundo, o espetáculo de Deus e dos anjos! Que faziam? De que se ocupavam? Que fama tinham na terra? E tu queres ter um nome e uma posição gloriosa? Não conheces a Maria nem a Jesus! Dizes: não tenho nada que fazer; quando, em parte, a obra da salvação dos homens está em tuas mãos. Não existem inimigos que reconciliar, diferenças que eliminar, dissensões que terminar, do que disse o Senhor: ‘Tereis salvado vosso irmão’ (Mt., XVIII, 15)? Não existem miseráveis que se há de impedir que murmurem, blasfemem, se desesperem?  E quando tudo isso se tenha concluído, não resta ainda o negócio de tua salvação, a verdadeira obra de Deus para cada um de nós?”

Quando se medita na vida oculta de Nazaré, neste silêncio e progresso espiritual de Maria, e depois, por oposição, no que o mundo moderno chama com frequência de progresso, se chega a esta conclusão: nunca se falou tanto de progresso como se esqueceu do mais importante de todos, o progresso espiritual. O que aconteceu? O que tantas vezes fez notar Le Play, que o progresso inferior buscado por si mesmo, está acompanhado da facilidade do prazer, da ociosidade e descanso, de um imenso retrocesso moral até o materialismo, o ateísmo e a barbárie, como mostram muito bem as duas últimas guerras mundiais.

Em Maria, pelo contrário, encontramos a realização cada vez mais perfeita da palavra evangélica: “Amarás o Senhor teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todas as tuas forças e com todo teu espírito, e ao próximo como a ti mesmo” (Lc., X, 27).

Quanto mais avança, mas ama a Deus com todas as suas forças, ao ver, durante o ministério público de Jesus, como se eleva contra Ele a contradição, até a consumação do mistério da Redenção.







(1)    – Elévations, XX semana, IX e X elev.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

A CARIDADE FRATERNA – Parte III


Pe. Garrigou-Lagrange, O.P.,
La Providence et la Confiance en Dieu

A Prática da Caridade Fraterna e os Cuidados da Providência

Santa Catarina de Sena adverte continuamente no Diálogo que a Providência nos deu a cada um, qualidades muito diferentes para que nos ajudemos mutuamente e tenhamos ocasião de praticar a caridade fraterna. Não faltam, por outra parte, ocasiões de faltar a ela, mesmo em ambientes muito cristãos, nos quais, junto a virtudes admiráveis se manifestam verdadeiras enfermidades morais. E mesmo suprimindo todos os defeitos, não faltam motivos de choque e de atritos pela variedade de temperamentos, de caracteres e de aptidões intelectuais que orientam um para a ciência especulativa, outro para a técnica, este para a síntese, aquele à análise. Outras vezes se originam as dissenções porque há quem se compraz em dividir para estorvar a obra de Deus, para impedir, sobretudo, as obras mais elevadas, mais divinas e mais belas. Somente no céu desaparecerá todo motivo de conflito, porque lá, todos os bem-aventurados, à luz divina, veem no Verbo quanto devem desejar e querer.

No meio de todo este cúmulo de dificuldades, como se há de praticar a caridade fraterna? De duas maneiras: primeiro pela benevolência, considerando o próximo à luz da fé, para descobrir nele a vida da graça ou ao menos as aspirações à esta vida; depois pela beneficência, servindo ao próximo, suportando os defeitos dos demais, pagando o mal com o bem, evitando a inveja e pedindo continuamente a Deus a união dos espíritos e dos corações.

Primeiro a benevolência. Temos que ter olhos puros e atentos para ver no próximo, as vezes sob aparência rude e sombria, a vida divina ou as aspirações latentes dela, fruto das graças atuais que todos os homens, um dia ou outro recebem. Para ver assim a alma do próximo, deve haver uma desapegar-se de si mesmo. O que muitas vezes nos impacienta e irrita no próximo não são as faltas graves aos olhos de Deus, mas os defeitos de temperamento ou as inclinações do caráter, compatíveis com a virtude real. Suportamos com maior facilidade a pecadores muito afastados de Deus, porém de condição amável, que a certas almas que, mesmo sendo virtuosas, põem as vezes a prova a nossa paciência. Devemos, pois, considerar à luz da fé aqueles com quem convivemos, para descobrir neles o que agrada a Deus e amá-los com Ele os ama.

Agora, é muito oposto à benevolência o juízo temerário, que não é uma simples impressão a respeito do próximo, mas que consiste em afirmar o mal por leves indícios. Veem-se dois, mas se diz que são quatro, geralmente por orgulho. Quando o juízo é plenamente deliberado e consentido em matéria grave, é falta contra a caridade e a justiça. Contra a justiça porque o próximo tem direito a sua boa fama, que, depois do direito de cumprir com o dever é um dos mais sagrados, muito mais que o direito de propriedade. Pessoas que jamais roubariam vinte francos, roubam ao próximo a reputação com juízos temerários sem fundamento algum. A maioria das vezes o juízo temerário é falso; como é possível julgar com verdade as intenções íntimas de uma pessoa cuja dúvida, erros, dificuldades, tentações, bons desejos e arrependimentos ignoramos? E mesmo o juízo temerário seja verdadeiro, sempre é falta contra a justiça, porque ao emiti-lo, se arroga a jurisdição que não o corresponde: só Deus pode julgar as intenções dos corações, enquanto não são suficientemente manifestas.

É também falta contra a caridade, por vir de espírito malévolo, que só a cor de benevolência deixa escapar alguns elogios superficiais, que terminam sempre com um mais característico. Em lugar de considerar o próximo como irmão, se vê nele um adversário ou rival à quem é preciso combater. Por São Mateus nos diz Nosso Senhor: “Não julgueis para não serdes julgados. Porque com o mesmo juízo que julgardes sereis julgado, e com a mesma medida que medirdes sereis medidos. Mas tu, como te pões a olhar a palha que está no olho de teu irmão e não repara a trave que está em teu olho?” (Mt., 7,1).

Porém, se o mal é evidente, nos manda Deus, por ventura, que nos enganemos? Não, mas proíbe-nos murmurar com orgulho; as vezes nos impõem, em nome da caridade, a correção fraterna realizada com benevolência, humildade, doçura e discrição; e se é impossível ou inútil a correção fraterna particular, se deve pedir, as vezes humildemente, ao superior encarregado de velar pelo bem comum. Finalmente, como diz Santa Catarina de Sena, quando o mal é evidente, o mais perfeito seria não murmurar, mas compadecer-nos e carregar nós mesmo com o mal diante de Deus, ao menos em parte, a exemplo de Nosso Senhor que carregou todas as nossas faltas e nos disse: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo., 13,34). Está é uma das maravilhas do plano da divina Providência. Para não cair, pois, nos juízos temerários, acostumemo-nos a olhar o próximo à luz da fé.

Devemos também ama-lo com atos, eficaz e na prática com amor de caridade benévola e benéfica. De que maneira? Fazendo favores sempre que nos pedir e nos seja possível. Suportando seus defeitos, que é uma maneira de fazer favor e de conseguir pouco a pouco sua correção. Lembremos que a este propósito que não são as faltas graves o que mais nos impacienta no próximo, mas certos defeitos de temperamento, como nervosismo, que faz ser brusco ao fechar a porta, a estreiteza de juízo, a falta de oportunidade, a mania de presumir e outros defeitos semelhantes. Sejamos tolerantes uns com os outros, sem irritar-nos por um mal permitido por Deus para humilhar a uns e provar outros; não degenere nosso zelo em dureza e ao queixar-nos de alguém, não creiamos ter realizado um ideal. Não façamos a oração do fariseu.

Saibamos dizer uma palavra boa no momento oportuno; este é o meio que a Providência põe em nossas mãos para ajudar-nos mutuamente. Um religioso cheio de dificuldades se reanima com uma simples palavra do superior que o deseja muitos consolos no desempenho do ministério e também tribulações que o sirvam de purgatório nesta terra.

A fim de que nosso amor ao próximo seja efetivo, deve-se evitar a inveja, para o qual, como o adverte Bossuet,devemos alegrar-nos santamente das qualidades que Deus dispensou aos demais e que não resplandecem em nós. O mesmo cabe dizer da distribuição do trabalho e dos ofícios eclesiásticos, que contribuem para o esplendor da Igreja e das Comunidades Religiosos. Como diz São Paulo, a mão, longe de invejar o olho, se aproveita da luz que deste recebe; assim também, longe de invejarmos uns aos outros, alegremo-nos das qualidades que vemos no próximo; são também nossas, por sermos todos membros de um mesmo corpo místico, no qual tudo deve concorrer à glória de Deus e à salvação eterna das almas.

Não só temos que tolerar-nos e evitar a inveja como também é preciso pagar o mal com o bem por meio da oração, do bom exemplo e da ajuda mútua. Conta-se de Santa Teresa que um dos meios de conquistar sua amizade era ocasiona-la desgostos. A Santa praticava o conselho de Nosso Senhor: “Se alguém quer tirar-lhe a túnica, dá-lhe também o manto.” É particularmente eficaz a oração pelo próximo no momento mesmo em que nos está fazendo sofrer de alguma forma, como foi a oração de Santo Estevão Protomártir por seus carrascos e a de São Pedro de Verona, mártir, por quem lhe deu a morte.

Finalmente, para praticar devidamente a caridade fraterna devemos pedir continuamente a união dos espíritos e dos corações. Na Igreja nascente dos primeiros cristãos formavam “um só coração e uma só alma”, e deles se dizia:“Vejam como se amam”; e o disse Nosso Senhor: “Nisso conhecerão que são meus discípulos.” Toda família cristã e toda família religiosa deve ser, à luz da fé, uma cópia da íntima união dos cristãos da Igreja nascente. Desta maneira seguirá se cumprindo a oração de Jesus Cristo: “Não rogo somente por estes (os apóstolos) mas também por aqueles que creram em Mim por meio de sua pregação, para que todos sejam um; e como Tu, ó Pai, estás em Mim, e Eu em Ti, assim sejam eles uma mesma coisa em Nós, para que o mundo creia que Tu me enviaste. Eu os dei a glória que Tu Me deste, para que sejam um, como Nós somos um.” (Jo., 17,20).

Assim se realiza de maneira forte e suave o plano providencial, assim se ajudam mutuamente os homens para caminhar para vida eterna. E aqui descobrimos uma prova da origem divina do Cristianismo; porque o mundo, que edifica sobre o egoísmo, sobre o amor próprio e os interesses que dividem, não pode produzir esta caridade; as associações mundanas não tardam a dissolver-se, porque nas palavras bonitas de solidariedade e fraternidade se ocultam muitas invejas e ódios profundos.

Somente o Salvador pode libertar-nos, que para isso veio ao mundo. “Qui propter nos homines et propter nostram salutem descendit de coelis... et homo factus est.”

A CARIDADE FRATERNA – Parte II


Pe. Garrigou-Lagrange, O.P.,
La Providence et la Confiance en Dieu


Qual é o objeto secundário da caridade?

Nos diz o segundo mandamento da Lei: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo por amor a Deus.” O objeto secundário da caridade somos, antes de tudo, nós mesmos, devemos nos amar santamente, desejando nossa salvação para glorificar eternamente a Deus; o é, em segundo lugar o próximo, a quem por amor a Deus temos que amar como a nós mesmos, desejando-lhe a salvação e os meios que conduzem a ela, afim de que juntamente conosco glorifique eternamente a Deus. Nosso Senhor nos apresenta o amor ao próximo como consequência necessária, irradiação e sinal certo do amor de Deus: “Nisto conhecerão que são meus discípulos, se tiveres amor uns aos outros” (Jo 13,35). E diz em outro lugar São João: “Se alguém diz: amo a Deus; porém aborrece seu irmão é um mentiroso” (I Jo 4,20).

A caridade fraterna, como se vê, difere infinitamente da inclinação natural que nos move a fazer o bem ao próximo para o agradar, ou nos leva a amar os benfeitores, a aborrecer aos que nos fazem mal e a ser indiferente com os demais. O amor natural nos faz nos faz amar o próximo por suas boas qualidades naturais e pelos benefícios que dele recebemos. Porém o motivo da caridade é muito distinto; a prova disto é que devemos “amar mesmo nossos inimigos, fazer o bem aos que nos aborrecem e orar pelos que nos perseguem” (Lc. 6, 27-35).

A caridade é também superior à Justiça, não somente a comutativa e a distributiva, mas também à justiça legal e à equidade, que nos mandam respeitar os direitos do próximo por amor ao bem comum da sociedade.

A caridade nos faz amar a nosso próximo e mesmo nossos inimigos, por amor a Deus com o mesmo amor sobrenatural e teologal com que amamos a Deus.

Porém, como é possível amar com amor divino aos homens, que em geral, são imperfeitos e mesmo malvados?

A Teologia responde com um exemplo muito simples que comenta Santo Tomás desta maneira: “O que muito ama seu amigo, ama com o mesmo amor aos filhos deste amigo; os ama porque ama a seu pai, e em consideração a seu pai lhes deseja todo bem; se necessário fosse, iria em socorro deles por amor a seu pai e mesmo perdoaria suas ofensas. Se os homens, pois, são filhos de Deus, ou ao menos são chamados a sê-lo, devemos amar a todos, mesmo nossos inimigos, e ama-los na medida com que amamos nosso Pai comum” (1).

Para amar desta maneira a sobrenatural a nosso próximo, preciso é contemplá-lo com os olhos da fé, dizendo: esta pessoa de temperamento e de carácter opostos aos meus, “não nasceu somente da vontade da carne e do sangue ou da vontade do homem”; como eu, “nasceu de Deus” ou foi chamada a nascer de Deus, a participar da mesma vida divina, da mesma bem-aventurança. Com estes olhos devem olhar-se todos os membros de uma mesma família; e não somente estes, mas também os da mesma associação e da mesma pátria, e muito mais aos da Igreja inteira, que sem desconhecer a natural e necessária variedade de pátrias, as compreende todas para dar entrada a todos seus membros no Reino de Deus.

E assim, podemos e devemos dizer das almas com quem vivemos e mesmo daquelas que naturalmente nos são antipáticas: Esta alma, mesmo quando não estiver em graça de Deus é certamente chamada a estar ou a tornar-se filha de Deus, templo do Espírito Santo, membro do corpo místico de Cristo; quem sabe este esteja mais próximo que eu do Coração de Nosso Senhor e seja uma pedra viva trabalhada mais que muitas outras pela mão de Deus, para ocupar um lugar na Jerusalém Celeste.
Como, pois, não ama-la, se amo a Deus de verdade? E, se não amo esta pessoa, se não desejo seu bem e sua salvação,meu amor a Deus é uma mentira. Se, pelo contrário, a amo, não obstante a diferença de temperamento, de caráter e de educação, é sinal que amo a Deus. Posso realmente amar esta pessoa com o mesmo amor essencialmente sobrenatural e teologal com que amo as Três Pessoas divinas; porque nela amo a participação da vida íntima de Deus que já recebeu ou está destinada a receber, amo a realização da ideia divina que dirige seu destino e a glória que é chamada a dar a Deus.

Objetam os incrédulos: porém, é isso realmente amar o homem? Não é melhor amar no homem somente a Deus e a Cristo, como se admira um diamante em seu precioso cofre?

O homem queria que o amassem por si mesmo; mas não é esse título para exigir o amor divino. Para reagir contra tão egoísta tendência dizia Pascal com frase intencionalmente paradoxal: “Não quero que me amem.”
Realmente a caridade não ama somente a Deus no homem, senão o homem em Deus e o homem por Deus. Porque a caridade o que deve ser o homem, parte imperecedoura do Corpo Místico de Cristo, e faz tudo que está a seu poder para que consiga alcançar o céu. A caridade ama mesmo o que o homem é por graça e, se não tem a graça, ama nele a natureza, não decaída, lastimada e hostil à graça, mas porque é capaz de recebe-la.

A caridade ama o homem mesmo, porém por Deus, para a glória que é chamado a tributar-lhe, que consiste na manifestação esplêndida da Bondade divina.

Tal é a essência do amor ao próximo ou da caridade fraterna: extensão de nosso amor de Deus a todos que são por Ele amados.

***
Daqui nascem as propriedades da caridade fraterna. Segundo ficou dito, deve ser universal, sem fronteiras. Não pode excluir ninguém, nem na terra, nem no purgatório, nem no céu. Somente se detém ante o inferno. Só se exclui os condenados que não são capazes de chegar a serem filhos de Deus e não há neles a menos chance de ressurgir; o orgulho e o ódio os impedem de sequer pensar em pedir perdão. Porém, fora do caso certo da condenação de uma alma, quem pode estar certo disso? A caridade se estende a todos, sem outros limites que do amor do Coração mesmo de Deus.

Resplandece aqui uma grandeza incomparável, que tanto mais ressalta, quanto mais divididas, humanamente falando, estão as almas, como aconteceu na guerra passada, quando um soldado alemão terminava a Ave Maria que a morte tinha deixado incompleta nos lábios de um soldado francês. Nosso Senhor e a Virgem Santíssima uniam aqueles dois irmãos, embora suas respectivas nações continuavam profundamente divididas. Este é o grande triunfo da caridade.

Para ser universal, não necessita a caridade ser igual para com todos; porque a caridade respeita e eleva a ordem ditada pela natureza. Devemos amar primeiro e sobretudo a Deus, mais que a nós mesmos, pelo menos com amor de estima (appretiative); e, se bem que, nem sempre sentimos esse fervor sensível do coração para com Ele, ao menos a intensidade deste amor deve ir constantemente em aumento. Logo, temos que amar nossa alma para glorificar eternamente a Deus, depois ao próximo e, finalmente, nosso corpo, dispostos sempre a sacrifica-lo pela salvação de uma alma, sobretudo quando é obrigação nossa fazê-lo. No que toca ao próximo, temos que amar primeiro os melhores, os que estão mais próximos de Deus, e também aqueles que estão mais próximos de nós pelo sangue, a afinidade, a vocação ou a amizade. Quando mais próxima de Deus está uma alma, mais merece nosso carinho. Quando mais próxima de nós está, mais íntimo é nosso amor por ela e mais completa deve ser nossa abnegação no que se refere à família, a pátria, a vocação e a amizade (2)Donde que a caridade não destrói o patriotismo, mas o eleva, como aconteceu com Santa Joana Darc e São Luís
.
Tal é a ordem da caridade: Deus quer reinar em nosso coração, mas sem excluir carinho algum que seja compatível ao Seu; antes o eleva, o vivifica e o faz mais nobre e mais generoso. Mesmo aos inimigos da Igreja devemos amar, rogando por eles; porém seria transtornar a ordem da caridade, com o pretexto de misericórdia, amar mais aos inimigos da Igreja que alguns de seus filhos que trabalham ao nosso lado.

Finalmente, a caridade fraterna, como o amor de Deus, não deve ser só afetiva, mas também efetiva e ativa, não somente benévola, mas também benfeitora. No lo disse Nosso Senhor: “Amai vos como eu vos tenho amado”; Ele nos amou até a morte de Cruz; os santos o imitaram fazendo de sua vida um ato contínuo de caridade transbordante, fonte de paz e santa alegria.

Tal é a caridade fraterna, extensão ou prolongação de nosso amor a Deus.

Continua...

Notas:
      (1)       – Santo Tomás, IIa – IIae, as duas grandes questões 25 e 26 sobre a extensão e a ordem da caridade. As resumimos nas páginas seguintes do texto.
      (2)       – Santo Tomás, IIa – IIae, q. 26, a.8.